
Hoje quero que minha voz fique mais forte, a voz do artista do terceiro mundo. Preciso que minha voz seja ouvida. Ela deveria ser ouvida não por que traga qualquer novidade, alguma verdade revigorante, nem porque prometa novas oportunidades ou inspire alguma ansiedade incompreensível. Não, minha voz deveria ser ouvida por que se não é ouvida agora, não será ouvida de modo nenhum. Vivemos em um tempo cuja única tarefa é a aceleração, ultrapassando-se a si mesma e esquecendo de tudo que não faça parte desta aceleração. Um artista do terceiro mundo não pertence à aceleração. Este artista pertence a algo além – um patético brado de impotência, letras sem serventia dos abandonados, desesperado grito de socorro, rouco bramido de indignação.
“O que é esse artista do terceiro mundo?” – vocês me perguntarão. “De que mundo está falando? Não há segundo mundo, há?”
Sim, responderei, o segundo mundo – o mundo do socialismo sem talento, impessoal, imbecil – não existe, enquanto o terceiro mundo ainda está por perto.É o mundo do obscurantismo fragmentado, o mundo das velhas tecnologias, o mundo do mercado indigente, o mundo que sofreu a catástrofe da ideologia comunal, o mundo da ética semi-arruinada e dos farrapos estéticos. Este mundo não pertence ao ocidente, ao oriente, ao norte ou ao sul. Ele está em todos os lugares. Está localizado num grande número de espaços, como um lençol rasgado em trapos, que cobre o deslumbrante corpo decaído do neo-liberalismo moderno. O terceiro mundo é o mundo dos discursos desprezados, das irrupções de carne fresca desperdiçada, escarro e esperma nos bairros pobres da Cidade do México e do Brooklyn, no gueto turco vienense e no coração de Moscou. Este terceiro mundo nervoso, com a cara cheia de espinhas e a língua presa, também precisa de um artista. Como mais poderia ser? Então porque eu não posso ser este artista e explicar para vocês que tipo de arte desagradável ele está tentando criar?
Como vocês sabem, o artista do terceiro mundo é um produto do primeiro mundo – avançado, capitalista – , e é um produto do segundo - socialista -, que ruiu e sumiu no vácuo. O artista do terceiro mundo é uma criança, o fruto de um coito parental monstruoso, que apareceu num monte de lixo transbordante por razões que nem deus sabe. Quem o jogou ali? Seu pai, um salafrário? Ou sua mãe, uma puta? O bebê não pode adivinhar, a menos que tios espertos da Sorbonne ou de Harvard o ajudem. Mas e se eles não o fizerem? Então, bem, valeu – vamos cuidar da gente mesmo.
O fato é que os tios de Princeton e Heidelberg já ajudaram e ensinaram, assim como os poetas-experimentadores de Paris e Londres e artistas de vanguarda de Zurique e Nova York. Foram eles que explicaram para a pobre criança do terceiro mundo que a cultura é uma grande força e poder, que a arte não apenas reflete a realidade, mas também a transforma, que a arte é uma guerra brutal, e em suas faixas se lê: “Negação! Liberdade! Análise! Revolução! Resistência!” E a pobre criança começou a agitar um pequeno sabre torto e empinar um cavalo de madeira. O bastardo entendeu tudo muito literalmente, a pequena e frágil sina. Mas esse é o tipo de consciência que temos no terceiro mundo, as mentes que temos – confiantes e não-reflexivas, ingênuas e não muito espertas, astuciosas, na melhor das hipóteses. Como esperam que façamos uma análise?!
Procedendo aparentemente pelas receitas de teóricos e praticantes da “terra da pedra sagrada” ocidental, o artista do terceiro mundo preparou para si uma terrível heresia, criou vários problemas e fez declarações bobas. Mas o que é mais importante é que estava tocando fora do tom. Estava procurando a verdade sendo um mentiroso nato, pedia justiça enquanto percebia que o perdão é mais importante, falava de amor enquanto o pânico guiava seu coração. Confundiu sucesso com significância, mas é a mesma coisa no primeiro mundo! Rebelou-se, ao mesmo tempo em que se importava com uma resenha numa revista, todo mundo ao redor é igual! O que se pode esperar de um parcamente instruído artista do terceiro mundo, a não ser trapaças infantis, urros terríveis e imprecações? O que mais pode oferecer um adolescente malcriado, convulsivo? Ele não pode oferecer nada.
Mas ao mesmo tempo, eu, o artista do terceiro mundo, rejeito todas as respeitadas virtudes e ofertas deste grande mundo bem-sucedido. Rejeito tudo isso, por que não acredito nele, o desprezo e estou entediado com ele. Rejeito o esnobismo intelectual e o bem-estar institucional que se tornaram o critério deste mundo. Rejeito a indústria do discurso pervertido mas impotente que garante sucesso neste grande mundo. Rejeito o vergonhoso dualismo ético que se tornou lugar comum no mundo presente. Rejeito a frustração sutil que se tornou o atributo necessário de um artista. Rejeito-a em favor de um sofrimento mais confortável, mas talvez mais frutífero. Rejeito a linguagem hipócrita e desonesta da arte contemporânea em favor de um gesto político elementar. No entanto, eu mesmo não sou tão simples e infantil. Chega de exageros patéticos! Gostaria de concluir como se segue: prometo ser sóbrio e astucioso, imaginativo e perigoso. Prometo agir de tal forma que vocês não possam me afundar ou me cercar de silêncio. Prometo trabalhar contra vocês hábil e cuidadosamente, prometo ser atencioso e ter o coração frio, para que possa atingi-los imperceptível e fortemente, onde eu possa, na medida em que tenha força suficiente, mesmo que não haja futuro nisso.
“O que é esse artista do terceiro mundo?” – vocês me perguntarão. “De que mundo está falando? Não há segundo mundo, há?”
Sim, responderei, o segundo mundo – o mundo do socialismo sem talento, impessoal, imbecil – não existe, enquanto o terceiro mundo ainda está por perto.É o mundo do obscurantismo fragmentado, o mundo das velhas tecnologias, o mundo do mercado indigente, o mundo que sofreu a catástrofe da ideologia comunal, o mundo da ética semi-arruinada e dos farrapos estéticos. Este mundo não pertence ao ocidente, ao oriente, ao norte ou ao sul. Ele está em todos os lugares. Está localizado num grande número de espaços, como um lençol rasgado em trapos, que cobre o deslumbrante corpo decaído do neo-liberalismo moderno. O terceiro mundo é o mundo dos discursos desprezados, das irrupções de carne fresca desperdiçada, escarro e esperma nos bairros pobres da Cidade do México e do Brooklyn, no gueto turco vienense e no coração de Moscou. Este terceiro mundo nervoso, com a cara cheia de espinhas e a língua presa, também precisa de um artista. Como mais poderia ser? Então porque eu não posso ser este artista e explicar para vocês que tipo de arte desagradável ele está tentando criar?
Como vocês sabem, o artista do terceiro mundo é um produto do primeiro mundo – avançado, capitalista – , e é um produto do segundo - socialista -, que ruiu e sumiu no vácuo. O artista do terceiro mundo é uma criança, o fruto de um coito parental monstruoso, que apareceu num monte de lixo transbordante por razões que nem deus sabe. Quem o jogou ali? Seu pai, um salafrário? Ou sua mãe, uma puta? O bebê não pode adivinhar, a menos que tios espertos da Sorbonne ou de Harvard o ajudem. Mas e se eles não o fizerem? Então, bem, valeu – vamos cuidar da gente mesmo.
O fato é que os tios de Princeton e Heidelberg já ajudaram e ensinaram, assim como os poetas-experimentadores de Paris e Londres e artistas de vanguarda de Zurique e Nova York. Foram eles que explicaram para a pobre criança do terceiro mundo que a cultura é uma grande força e poder, que a arte não apenas reflete a realidade, mas também a transforma, que a arte é uma guerra brutal, e em suas faixas se lê: “Negação! Liberdade! Análise! Revolução! Resistência!” E a pobre criança começou a agitar um pequeno sabre torto e empinar um cavalo de madeira. O bastardo entendeu tudo muito literalmente, a pequena e frágil sina. Mas esse é o tipo de consciência que temos no terceiro mundo, as mentes que temos – confiantes e não-reflexivas, ingênuas e não muito espertas, astuciosas, na melhor das hipóteses. Como esperam que façamos uma análise?!
Procedendo aparentemente pelas receitas de teóricos e praticantes da “terra da pedra sagrada” ocidental, o artista do terceiro mundo preparou para si uma terrível heresia, criou vários problemas e fez declarações bobas. Mas o que é mais importante é que estava tocando fora do tom. Estava procurando a verdade sendo um mentiroso nato, pedia justiça enquanto percebia que o perdão é mais importante, falava de amor enquanto o pânico guiava seu coração. Confundiu sucesso com significância, mas é a mesma coisa no primeiro mundo! Rebelou-se, ao mesmo tempo em que se importava com uma resenha numa revista, todo mundo ao redor é igual! O que se pode esperar de um parcamente instruído artista do terceiro mundo, a não ser trapaças infantis, urros terríveis e imprecações? O que mais pode oferecer um adolescente malcriado, convulsivo? Ele não pode oferecer nada.
Mas ao mesmo tempo, eu, o artista do terceiro mundo, rejeito todas as respeitadas virtudes e ofertas deste grande mundo bem-sucedido. Rejeito tudo isso, por que não acredito nele, o desprezo e estou entediado com ele. Rejeito o esnobismo intelectual e o bem-estar institucional que se tornaram o critério deste mundo. Rejeito a indústria do discurso pervertido mas impotente que garante sucesso neste grande mundo. Rejeito o vergonhoso dualismo ético que se tornou lugar comum no mundo presente. Rejeito a frustração sutil que se tornou o atributo necessário de um artista. Rejeito-a em favor de um sofrimento mais confortável, mas talvez mais frutífero. Rejeito a linguagem hipócrita e desonesta da arte contemporânea em favor de um gesto político elementar. No entanto, eu mesmo não sou tão simples e infantil. Chega de exageros patéticos! Gostaria de concluir como se segue: prometo ser sóbrio e astucioso, imaginativo e perigoso. Prometo agir de tal forma que vocês não possam me afundar ou me cercar de silêncio. Prometo trabalhar contra vocês hábil e cuidadosamente, prometo ser atencioso e ter o coração frio, para que possa atingi-los imperceptível e fortemente, onde eu possa, na medida em que tenha força suficiente, mesmo que não haja futuro nisso.
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